Em meio a uma investigação criminal do Ministério Público em que um funcionário é acusado de importunação sexual e tentativa de estupro por colegas de trabalho, a Petrobras enfrenta uma indefinição sobre qual a melhor estratégia para apurar esse tipo de caso na estatal.
O presidente da empresa, Jean Paul Prates, decidiu criar um grupo de trabalho com o objetivo de encontrar soluções para melhorar os processos de apuração e penalização de assédio dentro da empresa.
A iniciativa, no entanto, ignora um plano apresentado na última reunião do Conselho de Administração, em 29 de março, quando o departamento de compliance sugeriu novas formas de tratar esse tipo de caso. Prates não compareceu a essa reunião.
O encontro foi realizado três dias antes do presidente convocar, num sábado à noite, uma reunião emergencial para discutir uma ação paralela, o que culminou na criação do grupo de trabalho para investigar casos semelhantes ao que virou investigação criminal.
A informação foi confirmada pelos conselheiros presentes no encontro do dia 29.
Atualmente, os casos que se assemelham a qualquer tipo de assédio sexual dentro da empresa estão sob responsabilidade da área de segurança patrimonial, que trabalha com vigilantes e câmeras de segurança, com expertise em prevenir furtos e outros crimes contra o patrimônio da estatal. Oficialmente, a companhia afirma que foram 81 denúncias de assédio e importunação recebidas nos últimos quatro anos.
A CNN apurou com fontes da alta cúpula da Petrobras, que o plano do departamento de compliance foi uma tentativa de corrigir um processo tido como desastroso dentro da empresa.
O plano apresentado, porém, não foi bem aceito na companhia. Embora tenha sido construído usando a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) como referências, ele foi avaliado como “problemático” pelo Comitê de Auditoria da Petrobras, que reúne três conselheiros e um participante externo.
A proposta feita pela equipe de conformidade previa a contratação de uma auditoria externa, a implementação de boas práticas e o treinamento de mulheres para entrevistarem vítimas de assédio.
Outra crítica apontada por fontes ouvidas pela CNN está na composição da equipe de apuração, formada por 120 pessoas, a maioria homens sem experiência para analisar casos de assédio.
A CNN procurou a Petrobras para comentar o caso. Quem falou em nome da empresa foi a nova diretora de Relacionamento Institucional e Sustentabilidade, Clarice Coppetti.
Ela afirmou à reportagem que “a nova diretoria executiva vai, com certeza, em conjunto com o trabalho que o grupo está fazendo, rever esses procedimentos que eventualmente não estejam adequados”. A primeira reunião do grupo de trabalho foi realizada na terça-feira (4).
“A política de consequências da empresa tem que ser muito mais rigorosa. Quando ela detectar agressões e crimes de assédio, tem que ser mais rígida do que a empresa vinha fazendo até hoje. A primeira demissão [do petroleiro acusado de importunação e tentativa de estupro], pelo atual presidente, é sinalizadora de que nós temos que ter consequências mais efetivas na empresa”, afirma Clarice.
Em um comunicado divulgado no último domingo (2), Prates afirma que pediu, no início de março, uma revisão dos mecanismos de prevenção, combate e investigação aos casos de assédio.
“Onde houver oportunidade de melhoria e mais rigor nesse enfrentamento, promoveremos mudanças. Esse é o compromisso da nossa nova gestão, que tem a valorização das pessoas como eixo central. Em breve divulgaremos a nossa força de trabalho novas medidas de fortalecimento da prevenção e combate ao assédio. Não toleraremos nenhum tipo de violências”, disse.
Denúncias
A situação piorou recentemente, com a denúncia de importunação sexual e tentativa de estupro contra um funcionário.
Diferentemente de investigações de fraude contábil e corrupção, que levam em média 90 dias para serem concluídas, o processo que culminou na demissão com justa causa do funcionário levou seis meses.
Além da demora e da burocracia interna, alguns profissionais envolvidos com o caso, ouvidos pela CNN, apontam erros na condução do caso, como as entrevistas com as denunciantes e supostas vítimas terem sido feitas por homens despreparados.
Os crimes do funcionário demitido teriam ocorrido no Centro de Pesquisas da Petrobras, na Ilha do Fundão, na zona Norte do Rio de Janeiro.
Foi nesse caso em que o Ministério Público se baseou para abrir um inquérito. O Ministério Público do Trabalho (MPT) também foi acionado.
Internamente, pessoas ligadas à discussão defendem que a média de denúncias de assédio na petrolífera está abaixo dos índices do setor, mas reconhecem que há subnotificação, até pelo fato de mais de 80% dos funcionários da empresa serem homens.
A Federação Única dos Petroleiros (FUP), que engloba os sindicatos de categorias que preenchem os quadros da Petrobras, também se manifestou.
Eles dizem ter entregue uma carta a Prates pedindo mais celeridade na apuração das denúncias. Na nota da entidade, a diretora Cibele Vieira afirmou que “não adianta a empresa fazer campanha para incentivar a denúncia se ela própria não lida de forma sensata com a situação”.
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Fonte: CNN Brasil