Há pouco mais de uma década, a bandeira palestina estava pendurada ao lado das bandeiras israelense e americana na residência do primeiro-ministro israelense, quando Benjamin Netanyahu e o presidente da Autoridade Palestina, Mahmoud Abbas, compartilharam um aperto de mão histórico.
Hoje, Netanyahu está de volta ao poder e Abbas nunca saiu, mas muitas outras coisas mudaram, incluindo a atitude de Israel em relação à bandeira palestina.
Neste mês, o novo ministro da Segurança Nacional de Israel, Itamar Ben Gvir, ordenou à polícia que retirasse as bandeiras palestinas em qualquer local público em Israel, alegando que elas são um símbolo de mobilização para terroristas. E um artista se sentiu forçado a responder ao decreto de Ben Gvir.
Assim que soube da ordem do ministro, o artista visual de Tel Aviv, Michael Rozanov, desenhou-se com as cores da bandeira palestina e fez da obra de arte sua foto de perfil no Facebook.
“É ridículo, você quer derrubar bandeiras? E se eu fosse uma bandeira, o que você faria? Você me retiraria porque estou usando certas cores?”, disse Rozanov, conhecido como Mysh. “Então eu desenhei esta ilustração que me levou 10 minutos”.
Ele não esperava atrair muita atenção, mas dezenas de israelenses se juntaram a Mysh, pedindo-lhe para desenhar suas fotos de perfil com a bandeira palestina na esperança de causar algum impacto.
“E então pensei, sim, seria bom oferecer a outras pessoas para participar. Porque gosto de desenhar e gosto de começar algo online”, disse Mysh à CNN.
Ele também desenhou Ben Gvir vestido com as cores da bandeira palestina, até o kippa, o gorro usado pelos judeus religiosos.
Mysh está longe de ser o único israelense insatisfeito com o novo governo de Netanyahu. A coalizão de direita do primeiro-ministro conquistou uma pequena maioria do voto popular nas eleições de novembro, mas críticos e oponentes se opõem a uma ampla gama de suas medidas, incluindo a proibição da bandeira palestina, maior deferência aos ultraortodoxos e planos para mudar o sistema judiciário.
Mais de 100 mil pessoas compareceram a Tel Aviv na noite de sábado, o mais recente – e maior – de uma série de protestos semanais contra as reformas legais que os aliados de Netanyahu estão planejando.
Mas nem todos os israelenses receberam bem os desenhos de Mysh. Um usuário no Facebook acusou-o de “espalhar uma bandeira de ódio”, acrescentando: “Que chatice”.
Outro disse: “O que isso quer dizer? Que agora é legal pertencer a uma nação que se rendeu a seus líderes terroristas? O Hamas não quer paz conosco, o que não está claro?”.
Mysh fazia questão de responder a cada comentário para explicar e até tentar convencer seus críticos. Mas ele acredita que a tentativa de Ben Gvir de proibir publicamente a bandeira palestina, que é tecnicamente legal para hastear em Israel, é uma continuação da direção que Israel vem seguindo desde sua fundação em 1948.
“É definitivamente um passo à frente para a loucura, mas nada surpreendente”, disse Mysh. “Acho que o que vemos agora é a destruição dessa ilusão que a maioria dos israelenses tenta manter, de que eles podem viver em uma democracia liberal que respeita todos os direitos humanos, ao mesmo tempo em que rouba mais de cinco milhões de pessoas dos mesmos direitos básicos”, disse ele, referindo-se à população palestina.
Artista que usa diferentes mídias – filme e animação, ilustração e quadrinhos – para abordar questões sociais e políticas, além de sexualidade e gênero, Mysh veio da Letônia para Israel ainda adolescente, em 1993, e serviu no exército por três anos.
Mas um dia, fazendo seu serviço de reserva em um posto de controle israelense no Vale do Jordão, ele diz que teve uma visão poderosa da experiência palestina.
“A única razão pela qual o posto de controle existia era para tornar a vida das pessoas na aldeia mais difícil”, disse Mysh. “Estávamos verificando as mesmas pessoas duas vezes por dia. Eram principalmente mães que levam seus filhos para o jardim de infância do outro lado da aldeia”.
“Houve um dia em que eu estava parado com minha arma e outro soldado verificando os cartões de identificação e, de repente, percebi que sou um homem adulto que aponta uma arma para uma criança de 3 anos. E eu digo a mim mesmo: ‘Não estou realmente apontando para ele. Estou apenas parado aqui’. Sim, mas ele não sabe disso. O que ele vê é essa criatura assustadora apontando uma p**** de uma arma”.
“De repente me ocorreu a perspectiva do outro lado, que é essa criança que duas vezes por dia vê esse monstro apontando uma arma para ela. Quais são as chances dessa criança crescer pronta para me ver como um ser humano como eu sou? Como posso esperar que ele me perceba como um ser humano? Então eu decidi que estou fora. Não vou mais fazer isso”, disse Mysh.
Mysh vê uma conexão direta entre os postos de controle militares de Israel e a tentativa de Ben Gvir de proibir essencialmente a bandeira palestina, que provavelmente será testada no tribunal.
“Todo sistema opressivo é um sistema fraco porque não pode suportar nenhum atrito”, argumentou Mysh. “É preciso aplicar uma quantidade enorme de violência para evitar atritos”.
É isso que Ben Gvir está tentando alcançar, disse Mysh: “É uma ideia de que, para alcançar nossa identidade nacional, precisamos tirá-la de outras pessoas”.
Este conteúdo foi criado originalmente em inglês.
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Fonte: CNN Brasil