Agosto foi o mês da visibilidade lésbica e um dos temas mais recorrentes que tive em minhas conversas com profissionais, formadoras de opinião e celebridades lésbicas nesse período, foi a invisibilidade e o apagamento de mulheres lésbicas e bissexuais em todos os espaços sociais e de poder, e aqui quero destacar o mundo corporativo.
Mesmo em um mês no qual tivemos duas datas focadas em pautar mulheres lésbicas, afinal 19 de agosto foi o Dia do Orgulho Lésbico, criado em 1983 em São Paulo, dia que ficou conhecido como o “Stonewall brasileiro”, e 29 de agosto, Dia Nacional da Visibilidade Lésbica, data instituída por ativistas lésbicas brasileiras após a realização do 1° Seminário Nacional de Lésbicas (SENALE), que foi realizado em 29 de agosto de 1996, pouco vimos empresas, mesmo as mais atuantes em gestão da diversidade, visibilizando os trabalhos que têm realizado em diversidade sexual e o foco em mulheres homossexuais.
Acredito que este fenômeno de apagamento tem raízes fincadas na dupla opressão, gênero (ser mulher) e homossexual (ser lésbica) que incide sobre este grupo.
Os ditos direitos sexuais foram negados durante muito tempo a nós mulheres, basta lembrarmos que até 1940 existia algo que chamamos de tutela jurídica da sexualidade feminina no Código Penal brasileiro, ou seja, os crimes passíveis de serem cometidos por mulheres estavam todos ligados à ideia central da tutela do Estado sobre o corpo e a sexualidade da mulher.
E ainda, nós mulheres, só fomos autorizadas a falar de direito a sexualidade a partir de 1989, ainda que, propriamente, a Constituição da República no Brasil estabeleça, por meio do Artigo 226 no Parágrafo 7º, que tanto o homem quanto a mulher são livres para fazerem suas escolhas quanto à sexualidade e reprodução.
Segundo o Estudo Diversidade, Representatividade e Percepção – Censo Multissetorial da Gestão Kairós 2022, que reúne dados de uma amostragem de mais de 26 mil respondentes ao nível América Latina, mulheres representam 25% das posições de liderança (nível gerente e acima) de grandes empresas.
O que já expõe a sub-representatividade de mulheres em relação à demografia da sociedade brasileira, formada por 52% de mulheres, segundo o IBGE.
Ainda segundo o estudo, se estratificamos orientação sexual na liderança, temos que Lésbicas, Gays e Bissexuais são, respectivamente, 0,6%, 1,3% e 1,5% dos públicos mencionados acima. Lembro que, segundo a Escala Kinsey, de 1950, pessoas homossexuais são 10% da população, e mais recentemente um estudo da IPSOS de 2023 apresentou um dado novo de 14%.
O que podemos concluir a partir desses dados é que as mulheres lésbicas estão sub-representadas na liderança das empresas, assim como em quase todos os espaços de tomada de decisão da sociedade.
Seja por estarem presentes, mas não se autodeclararem (aqui vale lembrar que profissionais homossexuais somente se autodeclaram em empresas nas quais encontram um espaço e um ambiente que proporcione segurança psicológica para tal atitude), seja por estarem sendo barradas no momento de contratação, seja por estarem enfrentando barreiras no momento de avaliação e promoções a cargos mais altos.
Fato é que o mês de agosto nos possibilitou, ou deveria ter possibilitado, a ampliação de diálogos, conversas e ações para assegurar mais visibilidade a esta parcela da população. Afinal, o que fingimos não existir, não demanda atuação e ações pragmáticas que assegurem igualdade e o direito de ser quem se é, sem que isso possa vir a significar um impeditivo de carreira.
O mês passou rápido, mas as oportunidades para que as empresas atuem de forma consistente estão presentes ao longo de todo o ano, seja em momentos cotidianos, nos quais surgem dilemas e desafios, seja no momento do planejamento anual, quinquenal e, assim, sucessivamente, nos quais são traçadas as metas ESG de longo prazo.
No trabalho que venho desenvolvendo junto a grandes empresas com atuação no Brasil e na América Latina reforço que só é possível avançar em inclusão e diversidade tendo a Gestão por trás de cada iniciativa. Sem Gestão da Diversidade – um conceito que criei e que tem se provado eficiente para que as empresas se tornem mais inclusivas – não há como transformar a realidade atual.
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Fonte: CNN Brasil