Instalar o Conselho de Ética, acompanhar a assistência ao povo Yanomami, investigar envolvidos nos atos criminosos de 8 de janeiro e taxar grandes fortunas por meio da reforma tributária. Essas são algumas das prioridades do candidato à presidência da Câmara dos Deputados Chico Alencar (PSOL-RJ).
Ele defende que o suposto chamado “ativismo judicial” do Judiciário criticado por ala de parlamentares se dá, “muitas vezes, em função da lentidão e omissões do Legislativo” e devido aos próprios questionamentos dos partidos.
Por isso, propõe um relacionamento mais colaborativo e, “quando de naturais divergências, explicitação de posições em alto nível”.
Sobre o novo arcabouço fiscal a ser enviado pelo governo federal ao Congresso, acredita que os eixos gerais devem ser divulgados até o fim de março.
Em seguida, realizar consultas públicas para então enviar o projeto ao Parlamento. Ele acredita ser possível votar o texto tanto na Câmara quanto no Senado até agosto.
Além de Chico Alencar, também estão na disputa pela presidência da Câmara o atual chefe da Casa, Arthur Lira (PP-AL), e Marcel van Hattem (Novo-RS).
Lira é o franco favorito e conta com o apoio de cerca de 20 partidos, incluindo PT e PL. Sua intenção é atingir ao menos 430 votos favoráveis.
A CNN enviou seis perguntas idênticas para as assessorias dos três candidatos, mas apenas a de Chico Alencar retornou com as respostas.
O questionário foi enviado para a equipe de Lira na última quarta-feira (25), mesmo dia que para a de Alencar.
Já para a assessoria de van Hattem, o questionário foi enviado após o anúncio de sua candidatura, na terça (31) à noite.
Veja a íntegra das respostas de Chico Alencar:
- Se eleito para a presidência, quais as prioridades para os primeiros seis meses de mandato?
Em diálogo com o colégio de líderes, instalar o quanto antes o Conselho de Ética e as comissões permanentes; unir todo o Parlamento para aprovar propostas concretas de combate à fome e à miséria que assolam nosso povo; criar uma comissão externa para acompanhar a tragédia do povo Yanomami e uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) — de preferência, mista – com o Senado — sobre a intentona golpista de 8 de janeiro.
Do ponto de vista da administração interna, melhorar o Portal da Transparência, para que a população tenha mais controle sobre cada centavo de recursos públicos gastos na Casa, e rever dispêndios que tenham sido reajustados recentemente acima da inflação, como o auxílio-moradia.
Retomar estudos para dividir os apartamentos funcionais em dois ou três: hoje são disfuncionais, enormes, ociosos, e insuficientes para os 513 deputad@s.
- A médio e a longo prazo, o que também pretende colocar em votação?
Reforma Tributária (progressiva, que taxe grandes fortunas), revogação do esdrúxulo teto de “gastos” sociais, recuperação de direitos para categorias precarizadas, limites de compras dos cartões corporativos, tirando dessas despesas todo o supérfluo, revisão do marco regulatório da internet, para estabelecer limites à “midiosfera extremista” das fake news e propagação de mentiras e “narrativas” que atentem contra a ordem democrática e constitucional (evitando qualquer tipo de censura prévia).
Prioridade para os projetos de alcance social e de democratização do orçamento público, sem privilégios para “castas” parlamentares e com absoluta transparência (orçamento secreto nunca mais!).
Ordenar a pauta, junto com o colégio de líderes, priorizando as demandas dos movimentos sociais de caráter nacional. Reunir, através das respectivas comissões, os projetos de Educação, Saúde, Meio Ambiente e Ciência e Tecnologia, para estabelecer um cronograma de votações e metas de desempenho legislativo a serem atingidas no período.
- O governo inicia o mandato com uma base que ainda não garante a aprovação de Propostas de Emenda à Constituição (PECs). Como analisa o cenário de governabilidade para o presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, ao longo dos próximos meses?
A melhor “governabilidade” é a do debate aberto e público sobre as propostas do Executivo que tenham que passar pelo Parlamento.
Nada de “toma lá dá cá”, alimentando a cultura nefasta do “criar dificuldades para obter facilidades”.
Denunciar qualquer tentativa, seja de quem for, de troca de apoio por cargos, direções de estatais, autarquias ou funções ministeriais.
Tudo tem que ser na política do convencimento, pelo conteúdo das propostas, e não na baixa politicagem. “Governabilidade” que forme maioria à base da troca de favores, como se sabe, é porta de entrada para a corrupção.
É sabido também que a Câmara dos Deputados, embora tão “sensível” a corporações economicamente poderosas e seus lobbies, não se fecha, na mais das vezes, a projetos que tenham forte apoio da sociedade, do povo.
Além do mais, Lula tem experiência, habilidade e sagacidade política para não ficar refém de imposições clientelistas: basta ter vontade política e pensar sempre, em primeiríssimo lugar, no interesse público. Sua incrível trajetória de vida o credencia para esses eventuais embates.
- Acredita que o relacionamento entre Câmara e STF pode ser melhorado? Se sim, como e por qual motivo?
A relação da Câmara dos Deputados com o STF tem que ser de respeito mútuo, e colaborativa até. Há uma minoria de parlamentares sempre reclamando de um “ativismo judicial” que se dá, muitas vezes, em função da lentidão e omissões do Legislativo.
E também por que, legitimamente, nós mesmos – através dos partidos – procuramos o Supremo para dirimir dúvidas constitucionais.
O relacionamento tem que ser de diálogo permanente, respeito à autonomia das instâncias, que são equânimes (com nenhuma se considerando mais importante ou qualificada que a outra). E, quando de naturais divergências, explicitação de posições em alto nível.
- Qual a meta do senhor para aprovar a reforma tributária e como defende que o texto seja desenhado?
Como já disse, é prioridade. Espero que o Executivo envie o quanto antes sua proposta, que temos o dever de avaliar no interesse da população, sobretudo das camadas marginalizadas, invisibilizadas, dos mais pobres nessa sociedade tão desigual e injusta que é a nossa.
Um novo ordenamento tributário que taxe mais quem ganhe e tenha mais, aumentando a alíquota do imposto sobre a herança dos super-ricos, por exemplo, ou ainda criando um imposto sobre grandes fortunas e IPVA para aviões e embarcações de passeio.
Que taxe mais o patrimônio que o salário e o grande Capital que o trabalho.
Que acabe com isenções e “incentivos” para quem, de fato, não precisa.
Que não comprima ainda mais as classes médias, que vivem um processo de empobrecimento.
Que reforce o combate à sonegação e à fraude, que drenam bilhões dos cofres públicos.
Que simplifique o fisco, reunindo impostos e definindo com clareza o destino de cada um, acabando com os desvios.
O debate e a votação da Reforma Tributária no Congresso Nacional têm que ser uma espécie de curso popular de educação tributária para nossa gente, e não um convescote de “especialistas”, de “notáveis”. Afinal, essa matéria incide diretamente na vida da população. E, como disse mestre Paulo Freire, “o povo não defende aquilo que não conhece”.
- De que modo o senhor enxerga ser a melhor maneira de o governo federal enviar a proposta do novo arcabouço fiscal em termos de conteúdo e prazo para votação?
Sugiro quatro etapas:
- Publicizar, até o fim de março, os eixos gerais de sua proposta;
- Realizar consultas públicas (a internet ajuda muito nisso), recolhendo opiniões da cidadania e de setores especialmente interessados (abril/maio);
- Enviar seu projeto ao Congresso Nacional (junho), que o discutiria até julho, realizando debates nas comissões e em audiências públicas;
- Votação nas duas Casas (em julho, podendo prorrogar até agosto);
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Fonte: CNN Brasil